sexta-feira, 10 de abril de 2009

Capítulo III - Nada de frágil neste sexo

Mulher [ (lat muliere) 1 Feminino de homem. 2 Esposa. 3 Pessoa adulta do sexo feminino. M. de casa: a que administra bem uma casa e cuida com economia e previdência da vida e educação da sua família (...)].
Michaelis
Desde o momento em que nasce, a mulher é educada a não ser mulher como um símbolo sexual. Ela aprende a andar na rua, quando sozinha, como se estivesse sempre com pressa, atrasadíssima para um compromisso: olhando para baixo e andando rápido.

Olhar para o chão significa não fazer contato com os homens, principalmente visual. Olhar nos olhos denota uma atratividade não recomendada. Portanto, o ato de se cobrir (leia "usar véu ou burca") é não parecer sensualmente atrativa. Ainda, as mulheres não se socializam com homens, nem em ambiente particular. Aqui, as casas são construídas de modo que há sala "para eles" e " para elas". Neste momento, exibem-se umas às outras, quando a minha leitura é a de que os comerciais de shampoo, condicionador e afins fazem sentido: total sentido.

Junto com o processo de abertura do país veio a aceitação da flexibilidade daquilo que seria um código de vestimenta das mulheres. Visivelmente nas ruas há mais locais sem burca/véu e não há imposição legal ou religiosa para este fim. Cabe à família decidir como elas devem se comportar diante da sociedade e, depois, o marido direciona sobre a forma de envolvimento social.

Um exemplo curioso disto que parece ser um pseudo-relacionamento é o fato de que um supermercado novo em Tripoli é o grande acontecimento da cidade, por, dentre outros fatores, apresentar uma estrutura inovadora para os padrões e ousadas para outras prateleiras que guardam produtos mais comuns e simples.
O supermercado se tornou um ponto que converge o encontro de jovens rapazes e solteiros que se dispõem a “paquerar” as damas que vão às compras. Uma vez observado isso, o estabelecimento decidiu criar dias específicos para determinados públicos. Se não me engano, às Sextas-Feiras e aos Domingos só é permitida a entrada de mulheres e/ou homens com família (mulher + filhos); do contrário, não são autorizados a entrar, nem que consumam milhares de libians dinares em compras.

Eu não consegui saber ou interpretar o que significa o casamento para um líbio, mas perguntei sobre o divórcio. Embora o Alcorão não o proíba, ele não sugere ou apóia. Assim, o divórcio é permitido e de um modo geral as mulheres são protegidas pela lei, já que a prioridade delas, enquanto seres do sexo feminino, é cuidar da casa e dos filhos: trabalhar é um privilégio secundário.
Quanto à poligamia, ao fato do homem poder ter até quatro esposas, isso é válido, desde que ele as trate de modo igualitário e justo e que a primeira esposa concorde com o fato dele ter outras mais.
Na Líbia, poucos são os homens que têm duas mulheres. O país ainda está blindado contra a crise, mas ser justo com quatro ao mesmo tempo tem lá sua resistência. As gerações quer praticavam poligamia quase estagnaram na década de 60-70 devido a mudança econômica à época, então, ter mais de uma mulher ficou fora de moda.

Sempre que posso, gosto de ir ao supermercado badalado para observar e me sentir observada - principalmente pelas mulheres. Algumas me olham com desgosto, indiferença, preconceito, arredio. Outras, com admiração, sorriso, leveza e interesse.

Essa semana comecei um trabalho em um ambiente mais diverso e fui apresentada, ao mesmo tempo, a sete líbias, mais ou menos da minha idade. Diria que as perguntas que passam pela nossa cabeça passam pela delas também, mas acho que aprenderam a ser discreta: já eu não consigo! E sendo em geral a imagem que elas têm da mulher ocidental como similar àquelas vendidas em filmes e revistas, o que nos deixa vulgar de um modo mais abrangente, até as acho simpáticas comigo. Tenho visto que pouco têm de frágil e que de certo modo nascem sabendo que precisarão ser fortes, independentemente do horizonte para o qual têm permissão para olhar.
Façam um teste: tentem sair às ruas e cruzar com várias pessoas andando do modo descrito. E, principalmente, tente não olhar nos olhos das pessoas. Para mim é no mínimo difícil e, quando consigo, desconfortável.

Um comentário:

Teca Camargo disse...

Adorei!!! O melhor capitulo ate agora!!! rsrsrsrsrsrsrs

*Não adesão à nova regra gramatical.