terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Dias sem luz. Dias de sol

"Se você está interessado em algo, você vai se concentrar nisso, mas se você concentrar a atenção em qualquer coisa, é provável que você também se interesse. Muitas das coisas que achamos interessantes não são tão por natureza, mas porque nos esforça a prestar atenção nelas". Mihaly Csikszentmihalyi*


Há mais ou menos duas semanas choveu muito em São Paulo: muito!, e pela primeira vez senti medo - as janelas da minha casa tremiam, faziam barulho e, no meu quarto, a água começou a entrar pelas frestas e eu via galhos e árvores inteiras serem derrubadas por vento - na avenida que faz esquina com meu prédio, carros, ônibus e motos pararam de passar e o temporal fazia de São Paulo um lugar deserto.

Era domingo, passava das quatro horas da tarde e meia hora depois do dilúvio, a luz acabou - fui dormir às 22h e ainda estava sem energia.

Nos primeiros 20 minutos de chuva eu não conseguia pensar em absolutamente nada, travei, apenas esperava que passasse e que a água pelas frestas diminuísse consideravelmente e que nenhuma janela quebrasse.

Assim que o volume diminuiu, abri as janelas e fiquei observando a cidade ir voltando ao seu "normal". Quando tive certeza de que acabara, mas que a luz provavelmente deveria demorar, visto os estragos, como num rompante, peguei folhas de ofício, canetinhas, post-its e comecei a planejar meu ano de 2018 - o que envolvia o que pretendo fazer durante minhas semanas, para meu equilíbrio, e como resultados de negócio (abri uma empresa em Novembro de 2017).

Eu não sei quantas horas me mantive naquele fluxo; me lembro de não ter levantado para tomar água ou comer alguma coisa. Em algum momento, reparei que a claridade já não estava tão intensa, mas ainda assim dava para rabiscar, escrever, desenhar, projetar e criar listas de ações e testes.

Entre um pensamento de viabilidade e outro, li um livro sobre Marketing Digital, que fez com que eu abrisse um parêntese do planejamento macro, para concentrar na leitura sobre ferramentas de comunicação da nossa era - o que me abriu várias abas, na verdade, sobre alguns conteúdos que me fascinam; e outros nem tanto.

Fui deitar mesmo porque não havia mais nenhuma luzinha - e não sou dessas de usar o celular para iluminar nada: acho que há limites.

No dia seguinte, 2a.feira, pude perceber que a luz havia voltado n'algum momento pela madrugada, mas me surpreendi mesmo foi com o volume de trabalho que eu havia produzido.

Precisei sair e, ao voltar, por volta das 11 horas da manhã, a luz acabara de novo - segundo informações, o início do meu quarteirão estava destruído e a companhia energética precisava retirar ainda muitas árvores de casas e postes. 

Apesar da frustração e, ao invés de optar por ir a algum café ou co-working em busca de energia e, claro, internet, decidi ficar em casa e terminar aquilo que havia brilhantemente começado - afinal, não foi planejado e os recursos eram escassos - foi incrível me manter, por horas, num fluxo real: "estado de excelência caracterizado por alta motivação, alta concentração, alta energia e alto desempenho.*"

O dia seguiu sem energia até às 21:30 e, enquanto havia "sol", lia e escrevia - inclusive, devorei mais um livro, dessa vez menos técnico, mas igualmente estimulante; desses que dá vontade de sair fazendo, mudando; que te tira de si mesmo.

Nesses dois dias sem luz, aproveitei que fossem dias de sol e, sem saber, quebrei um paradigma sobre criação, sobre rever ciclos de produção, sobre engenharias, sobre experimentar e, principalmente, sobre fazer da adversidade um poderoso gatilho para a transformação - aliás, empreender é exatamente isso, né?: "tudo começa do nada".


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*Não adesão à nova regra gramatical.