quarta-feira, 27 de junho de 2018

#queritmoéesse?

Eram 22horas de uma terça-feira cansativa e eu embarcava em Guarulhos rumo a BH.

Me dei conta do meu cansaço quando sentei no ônibus que nos levaria até o avião: poderia dormir ali naquele assento desconfortável, com as minhas costas latejando, meus pés pipocando, enquanto sentia um calor desproporcional ao vento frio lá de fora.

Sem que eu percebesse, me lembrei dos meus traslados nas Filipinas e como tudo ficava mais leve quando eu olhava para as pessoas naquele país e meditava: "meu tempo é o tempo do outro".

Quase que inconscientemente, olhei pr'aquelas pessoas naquele ônibus e vi muitos semblantes - talvez - parecidos com o meu: como as pessoas estão cansadas! - e, portanto, como também queriam chegar.

Isso tudo que deve ter acontecido em 10 segundo foi o suficiente para me ver fora de mim e me observar como outrem, meditando: "seu tempo é o tempo do outro".

Por um suspiro leve, relaxei; e que bom seria se todos pudéssemos nos ausentar de nós mesmos para essa compaixão própria que pouco nos damos, por não encontrarmos tempo - nem espaço.

Já em BH, dentre tantas conversas que pude ter, muitos me disseram que estão exaustos; que correm, correm, correm: corremos pra onde? Corremos pelo que? Temos em perspectiva a linha de chegada? - "Onde é lá"? E, quando tempo "ainda falta"?

Sei lá se deveria ser o tempo o pulso da vida: #queritmoéesse?

Eu tenho tentado não embarcar na viagem (que é a vida) somente pelo relógio - é difícil, mas tem me ajudado a ser e estar melhor; aliás, talvez esse seja o grande desafio em "darmos conta de tudo hoje-agora": ser enquanto estamos, para nos tornarmos num tempo, atemporal.

terça-feira, 19 de junho de 2018

As diaristas e o mundo freela

Cresci numa família classe-média-média dos anos 90, sem empregada doméstica. Lá em casa todos tinham suas obrigações mínimas e básicas e, confesso, meu pai foi um "homem atípico" por já lavar nossas fraldas de pano no início dos anos 80.

Durante minha vida adulta (que, ok, não faz tanto tempo assim), nunca tive "empregadas domésticas à moda antiga", vejo poucas delas hoje e, apesar de atribuir a isso vários fatores, inclusive sociais, vou me limitar (#voutentarmeumelhor) a um só: aumento das diaristas.

E essa condição de forma da oferta trabalho versus a flexibilidade da demanda tem me ensinado muito desde que passei a atuar como PJ ("autônoma" é ilusão 'tá gente? Se antes era "chefe", agora é cliente - e tá tudo bem, desde que você seja realista :)).

  • A diarista foge da rotina, faz sua agenda respeitando suas limitações logísticas, principalmente as que moram beeeeem longe dos seus clientes e são reféns das creches públicas e/ou de vizinhos e avós, desenvolvendo, além de resiliência para lidar com os imprevistos do trânsito (de São Paulo), muita, mas muuuuuita organização e gestão de tempo;
  • Tomar essas decisões (mesmo que inconscientemente) e alocar recursos, principalmente quando não os tem, desenvolve nelas uma criatividade surreal que eu, do auge do meu Uber que nem cheguei onde deveria, me espanto com a comunicabilidade delas, cada vez mais clara e transparente, mesmo "não sabendo escrever" - aliás, #salveoáudio!
  • Confiança: essas trocas, esse baile de adaptabilidade que elas dão, faz com que o vínculo só se fortaleça e que traçamos mesmo uma parceria ganha-ganha: precisamos da gente, mutuamente, nem mais, nem menos:#boracolaborar
  • Ah, inovação via benchmark! "Babi, usei numa outra casa que atendo um produto óóóóótimo para o sofá (...)". Essa visão aberta, genuína, sem culpa nem medo de propor: coisa linda (volta para o looping da confiança e segue).

Eu poderia listar muitos outros atributos que me revelam ganho nessa relação tão diferente da que os meus pais tiveram, ao finalmente poderem contratar uma "empregada doméstica", 18 anos atrás.

Essa experiência resume o lado bom do que os freelas* podem dar às organizações, porque se permitirão, antes, se atenderem primeiro enquanto indivíduos: é poderosíssimo isso!
E vejam só: as diaristas, pelo menos as que eu conheço, não negociam valor da diária como se não houvesse amanhã, nem perguntam do plano de saúde, ou ticket alimentação/refeição, nem muito menos pressionam para horário de chegada ou saída, ou reclamam que têm que pagar o INSS à parte: elas já entenderam que o preço dessa oferta de trabalho é outro - deixa de ser custo e passa a ser valor.
O mundo em que cresci está mudando e já quase não existe mais; gosto de ver meus pais se adaptando às possibilidades do hoje, porque entenderam que "empregada doméstica como antes não há" e, ao invés de ficarem se debatendo com esse dado de realidade, toparam experimentar a diarista, antes que a perdessem para alguém numa dessas plataformas de "vagas" e matching que existe por aí ;)

Enfim, nenhum cenário é perfeito, nenhuma fórmula é a do sucesso. Mas certamente, negar a mudança sobre a forma como trabalhamos , isso sim, é via sem saída.

*freela, PJ, staff on demand (que seja seu termo!)
*Não adesão à nova regra gramatical.