Dor [1 Med Sensação desagradável ou penosa, causada por um estado anômalo do organismo ou parte dele; sofrimento físico. 2 Sofrimento moral. 3 Dó; pena, compaixão (...)].
Michaelis
Um dia acordei com dor nas costas e achei que tinha sido fruto de uma noite mal-dormida - talvez o calor de 44oC-48oC - seguidos da falta de refresco com as constantes quedas de energia ao fim do dia até a madrugada.
Dois dias se passaram, mas as dores não e acabei optando por suspender a utilização da minha válvula de escape: a corrida na esteira!
Até que em uma manhã, a dor realmente me tirava o foco e então liguei para uma brasileira que é fisioterapeuta, para saber se ela recomendava algo - remédio, alongamento, qualquer coisa. E após responder algumas das perguntas dela, senti um alívio quando ela disse que muito provavelmente não seria nada demais, mas que era prudente consultar um neurologista no intuito de tentar fazer uma ressonância: "Não vá em ortopedista, senão ele pode te pedir raio-x e não necessariamente preciso ver sua estrutra óssea. Talvez você tenha machucado um nervo por postura - ou algo do tipo", orientou.
Assim, comecei a saga da aventura de literalmente me virar por aqui, me irritar, me surpreender e, de novo, (re) descobrir o potencial do ser humano em ser solidário e solícito ou simplesmente um ser que dá de ombros.
O neurologista, em consulta, reafirmou a hipótese de que não seria nada demais e pediu a ressonância, seguida de uma receita médica que ignorei - se ele não sabia o que era, qual era o ponto de uso dos medicamentos? O resultado saiu e ele disse que era um princípio de hérnia de disco e então a partir daquela data comecei a tomar duas injeções diárias e um anti-inflamatórioà noite. Sem melhora (rápida), fraquejei e dois dias depois desta consulta comecei a ficar de repouso.
Dez dias em casa, na Líbia, sem internet, canais a cabo que não apresentem uma programação considerável, em calor absurdo - embora ainda não o pico do que teremos - foi difícil, mas não relutei tanto (acho que melhorei no quesito paciência). Ainda, abstrai a idéia de que meu Outlook deveria estar prestes a explodir - se já não ocorreu - devido ao número de e-mails que chegam e não são respondidos (nem lidos).
Passado o tempo previsto de medicamento tomado, voltei ao médico. Aliás, tentei, porque ele havia sumido - de fato. As recepcionistas não tinham informação dele e só souberam me informar que ele não ia ao consultório por dois dias, que o celular estava desligado e que havia uma suposta hipótese de que ele estaria em algum Congresso por aí.
Assim, consegui saber que o neurologista que tinha "tratado" o caso do Felipe (voltemos mais uma vez e sempre a este fato) estaria disponível para me atender e que daria direcionamento aos próximos passos.
Dessa vez meu chefe foi comigo e me apoiou - principalmente em caráter emocional.
Naquela ocasião, o diagnóstico já era outro, nada de hérnia ou nervo, "apenas" um espasmo muscular. As injeções tinham sido desnecessárias e o repouso em certo ponto também. Dentre algumas mudanças de hábito sugeridas, fisioterapia estava na lista do que fazer de imediato para que eu melhorasse.
A Jana - essencial nisso tudo, depois a apresento - marcou para um motorista me buscar e me levar em um outro Hospital: desespero e irritação. Fui mal-atendida, os atendentes discutiam meu caso - eu acho - em árabe e me comunicavam o que fazer em inglês quando não era o que tinham dito anteriormente.
Vai-pra-lá-pra-cá, a dor só se intensificava e eu não conseguia nem horário para fisioterapia, nem os remédios. Por fim, resolveram que um médico de lá deveria me consultar para confirmar a receita que trazia comigo e, para minha surpresa, ele voltou a prescrever as injeções que tinham sido suspensas e a voltar ao diagnóstico de "algum nervo inflamado".
A minha única reação foi chorar. Chorei por todos os sentimentos atropelados juntos: medo, desconfiança, desespero, impotência - ao não consegui me comunicar e, portanto, entender e ser entendida - saudade e dor. Sobretudo, por sentir isso tudo sozinha, naquele momento.
Toda esta lenta e chata narrativa retrata alguns dias que me deram vontade de voltar para casa - se estiver em dúvida, leia-se Brasil - sem olhar para lugar nenhum, a não ser para frente. Passei a falar todos os dias com minha mãe, pelo telefone, e a não ter concentração nem interesse para terminar a leitura da Época Negócios - de que tanto sou fã e me faz inspirar. Não trabalhei e nem mantive o ritmo dos "excessivos e-mails a amigos para dizer que estou bem", o que fez alguns deles me ligar e perguntar por onde eu andava que não online, de alguma forma.
Hoje, finalmente, fui fazer a avaliação fisioterápica, com a conclusão de que tenho espasmo muscular. Começarei amanhã. Todavia, em se tratando do país, as mulheres têm horário diferente dos homens, portanto, os meus serão aos Domingos, Terças e Quintas, entre 8h-10h.
E entreguei para Deus, com um limite de tentativa de 12 sessões - ou menos.
Aproveitei para parar no escritório principal e acessar a internet para dar o "oi" de sempre, atualizar os que perguntaram, me por em dia e postar no blog, até mesmo para manter o registro de que as histórias se repetem, com algumas personagens alteradas e dessa vez saí do pano-de-fundo para a cena principal, (in)felizmente.
A parte "feliz" é que minha mente está tranqüila por ora e por todo tempo, na medida do possível dentre toda a adversidade disso aqui e que, ainda, embora eu tenha conhecido de perto os aspectos ruins que caracterizam o comportamento dos líbios, crítica a qual eu defendi aqui várias vezes, exatamente por entendê-los sobre uma perspectiva cultural diferente, vários deles se mostraram preocupados, solícitos e, mesmo os que não falam inglês, cada um a seu modo, se esforçaram em me garantir o que os médicos não conseguiram: certeza e confiança.
Neste tempo de fragilidade e insegurança, tem valido pensar que "a vida é um bumerangue".